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O sexo frágil que precisa ser forte desde a infância

A cada 24 horas cerca de 320 crianças e adolescentes entre 8 e 14 anos são vítimas do abuso e exploração sexual infantil, onde as meninas são a maioria

Meninas são maior alvo de exploração sexual (Foto: Dmitry Ratushny/UnsPlash)

A violência sexual é a quarta violação contra crianças e adolescentes mais denunciada pelo Disque 100, desde 2016. O Ministério dos Direitos Humanos revela que, ao longo do ano passado, foram 15.707 denúncias relacionadas à violência sexual dentre as 144.580 violações contra o público de 8 a 14 anos.


A visão da sociedade deve estar aberta para esse tipo de crime. É preciso entender que a violência sexual é caracterizada pela submissão da criança ou do adolescente, com consentimento ou não, a atos sexuais com a finalidade de satisfazer o agressor, que se impõe pela força, por ameaça ou pela sedução. Gira em torno de palavras até presentes ou troca de favores.


Neste ano, durante a mobilização nacional em combate ao abuso e exploração sexual de crianças e adolescentes, a Fundação da Criança e da Família Cidadã (Funci) realizou junto ao Fórum Clóvis Beviláqua a inauguração de uma sala especial de depoimento para ouvir as vítimas deste crime que gera traumas físicos e psicológicos.


Tânia Gurgel, diretora da Funci, explica que a sala significa amparo legal e proteção às vítimas e seus familiares. “É uma forma de acolher e proteger quem passa por esta situação, dar a liberdade de falar sobre o que acorreu e resguardá-lo com a prova do depoimento ao psicólogo”.


São vítimas como Maria, que no ano passado, ao ir à escola, foi induzida e abusada por um vizinho novo e gentil que a levou para casa e começou a trocar carícias e tocar a garota. Mesmo relutando e fugindo, a menina foi obrigada a permanecer com o agressor durante todo o período de aula. Tudo começou com elogios e conversas, até que a vítima de 12 anos se viu trancada e estuprada por quem ela confiava.



A situação foi revelada na mesma tarde a Júlia, mãe de Maria, que sentiu falta da menina quando não voltou acompanhada das colegas. Depois dos questionamentos da mãe sobre o que tinha acontecido, a menina quis mentir, mas as marcas em seu corpo estavam muito explícitas para manter o abuso escondido.


Mesmo apavorada com a situação, Júlia imediatamente foi à casa do agressor, que após o ocorrido ainda estava deitado sobre os lençóis ensanguentados. Ela foi à delegacia, denunciou o vizinho e foi conduzida a fazer os exames de corpo delito, que confirmou o crime contra a menina e resultou na prisão de Ademir.


A família de Maria foi ameaçada para que retirasse a acusação, em troca seria oferecida uma cesta básica por mês até a maioridade de Maria, como se este ato pudesse modificar as sequelas que acompanharão a menina por toda a vida. Um ano depois, após audiências, acompanhamento psicológico e a tentativa da integração social da garota, Maria tem progredido a passos lentos, se encontra dispersa, mas é assistida por uma ONG local, onde trabalha a pedagoga Marta Alves, que foi procurada pela avó da vítima. Marta orientou a família como proceder com a situação e acompanha o caso.

Marta Alves é a pedagoga que acompanha o processo da menina de Maria junto a ONG

Com palavras de consolo, a profissional busca ajudar a criança, que se sente suja e desvalorizada pelo que ocorreu. Incentiva a menina a dar um passo por vez, levantando a cabeça, se empoderando e confirmando a sua identidade como cidadã e como uma criança com um bom futuro pela frente.


Marta justifica o que sente quanto à realidade do ocorrido: “é uma situação triste. Infelizmente é um crime que tem feito vítimas por todo o país. As pessoas se calam por medo. Mas cada vez que eu me calo, estou encobrindo um agressor e punindo uma criança.”


Em busca de informações sobre o agressor, alguns vizinhos comentam que a mudança do inquilino tinha apenas seis meses quando a fatalidade ocorreu. Ele já vinha fugindo de outro bairro por ter cometido o mesmo crime.


Outro caso, desta vez em família. Fernanda, assim como Maria, sofreu abuso na infância. Quando tinha seis anos e morava com a avó, foi assediada pelo padrasto da mãe, que sempre se aproveitava da menina quando estava embriagado. A mãe denunciou, porém, aos 12 anos, aconteceu novamente, e agora o agressor era um tio.


Da primeira vez, Fernanda, que já era órfã de pai, foi ameaçada pelo agressor, que dizia matar a família da menina caso ela contasse para alguém. E da segunda vez, o tio presenteava a garota em troca de toques e carícias. As duas vezes foram descobertas pela mãe da menina e denunciadas.


Hoje, Fernanda tem 21 anos, e ainda lembra com facilidade tudo o que houve na sua infância. ”Eu não tenho mágoas deles, não mais. Mas foi difícil superar o medo do toque de outro homem. O tempo e o amor da minha família e amigos foram meus psicólogos. Hoje eu luto em defesa das vítimas desse crime e busco justiça pelas infâncias roubadas", afirma. Os nomes das duas vítimas, da mãe de uma delas, e do agressor são fictícios, tanto para proteger as vítimas como para não as identificar.


O Brasil é conhecido como um país patriarcal, onde o machismo impera e isso implica no papel da mulher ser totalmente submissa ao homem. Mesmo levando em torno do seu papel tanto trabalho e luta pela igualdade social, a figura feminina é desmoralizada e conhecida como o sexo frágil. Frágil para quem e em que tempo? Como é possível perceber pelo volume de casos, a infância de algumas meninas já as tornam fortes para o futuro que as esperam.

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