“Mulher em programa esportivo não é bibelô”
A Jornalista Ana Flávia Gomes, que começou a exercer a atividade de editora de esportes em 2013, afirma que a atividade feminina no jornalismo é esportivo um ato de resistência
Ana Flávia Gomes, 33, jornalista e editora do caderno de esportes do jornal O Povo, sempre quis trabalhar em esportes. Em sua época como estudante de Jornalismo, o futebol não foi o carro chefe como área de interesse, e sim, outras modalidades. Acompanhou, como expectadora, a geração de ouro do Vôlei em 1992, na olimpíada em Barcelona como também as meninas do basquete lideradas por Hortência e a Magic Paula.
A jornalista realça uma função da profissão que não fica restrita apenas à informação, ela afirma que o importante é trazer a notícia para o analítico, ou seja, para a análise das consequências que hoje é uma vertente do jornalismo impresso.
Segundo Ana Flávia, que trabalha no grupo de comunicação O Povo desde 2007, sempre houve respeito entre seus colegas para com ela e diz que se tornou editora do caderno de esportes do jornal pela força das circunstâncias: “Valorizo muito o lado coletivo. Há uma troca de ideias entre mim e os repórteres”.
No que se refere à discriminação sofrida, segundo relatos nas redes sociais e até em artigos científicos por profissionais do sexo feminino que atuam na área do jornalismo esportivo, Ana Flávia afirma que nunca passou por uma situação de assédio e discriminação no ambiente interno de sua atividade.
Todavia, em situações em que teve exercer sua atividade em espaços esportivos, o constrangimento foi inevitável: “já passei e é opressor. Coisas que você escuta na arquibancada... recebi ameaças de torcedor, piadinhas de dirigentes. Nunca fui agredida, mas já me senti ameaçada simplesmente pelo fato de ser mulher. Sofri ofensas públicas em rede social das quais, se eu fosse homem, não teria escutado”.
Acerca da repercussão dos debates sobre o combate ao assédio e discriminação na sociedade e do efeito que pode beneficiar as mulheres, a jornalista é otimista: “a gente tá falando mais sobre isso e quanto mais nós debatermos esse assunto mais as coisas vão ser colocadas no seu devido lugar”. E ainda pontua que o assédio e a discriminação não é um fenômeno apenas no jornalismo esportivo, é uma questão de discriminação contra a mulher. Não se sabe o motivo e o que incomoda é uma mulher que se insere nesse ambiente.
Mesmo com o consumo de futebol sendo ainda predominantemente masculino, a mulher constrói seu espaço nesse segmento na sociedade. Para Ana Flávia, “abre-se espaço para mulheres falarem, debaterem sobre futebol em redes sociais e é cada vez mais notório a presença de mulheres em estádios de futebol. O nível de conhecimento que determinadas jornalistas mulheres possuem sobre não só sobre futebol mas de outros esportes, só aumenta as minhas expectativas de ver mais mulheres no mercado, e que isso não demore a acontecer”.
“Sofri ofensas públicas em rede social que se eu fosse homem não teria escutado”
Ana Flávia Gomes, 33
Segundo ela, os desafios da mulher jornalista na área esportiva são inerentes a duas coisas fundamentais ao profissional. A primeira é o cuidado com a linguagem, algo que sempre a jornalista tem que desenvolver principalmente no campo de atuação em que a mulher tem demonstrar mais capacidade que o homem. A segunda é em relação a astúcia do jornalista em si .“Diferenciar olhares são importantes em um mercado enxuto como o nosso, até por que temos que correr atrás muito mais do que os homens”, afirma.
Ela disse também que a atividade da mulher no jornalismo esportivo é um ato de resistência. “Estou aqui como editora como resultado dessa resistência de gerações anteriores a minha, como a Raquel Chaves e tantas outras”, finalizou.
Com a palavra, a presidente
Samira de castro, Presidente do Sindicato dos Jornalistas Profissionais do Estado do Ceará (Sindjorce), compactua com a linha de raciocínio de Ana Flávia Gomes. Ela afirma que as mulheres passaram a enxergar algumas situações e com isso entender de fato o que é assédio. E o motivo desse entendimento é que, hoje, as mulheres têm muito mais informação e, na medida do possível denuncia essas práticas”.
Samira, que desde 2013 é presidente do Sindjorce, afirma que o combate ao assédio ocorre por uma questão de iniciativa: “a mulher tem quer coragem de romper o silencio e denunciar. Essa cultura do assédio se perpetua por que muitas vezes a mulher permanece em silêncio”. E complementa: “é triste, a sociedade pouco evoluiu. Ainda somos vistas como inferiores aos homens na garantia dos direitos. E isso não se refere ao direito da jornalista, mas da mulher em sentido geral”.
A presidente conta que já sofreu discriminação por ser representante maior dos jornalistas até mesmo no movimento sindical: “para muitos, quando sindicato é presidido por mulher é sindicato de mulherzinha”. E diz que, “muitas vezes, em mesa de negociação, quando a bancada patronal de um lado é composta só por homens e tem que negociar com uma mulher do outro, muitos deles tentam desacreditar nosso poder de argumentação”.
No que consiste ao combate ao assédio, Samira afirma que, este ano, foi criada uma comissão nacional de mulheres ligada a Federação Nacional dos Jornalistas (FENAJ) para trabalhar essa temática e o objetivo é de que a ideia é que se multiplique nos estados essa iniciativa nacional, fazendo debates, colhendo denúncias ou criando canais de denúncias em prol do combate ao assédio e à discriminação contra a mulher no mercado jornalístico.